domingo, 23 de janeiro de 2011

O Tempo e o Amor

Tudo cura o tempo, tudo faz esquecer, tudo gasta, tudo digere, tudo acaba.
Atreve-se o tempo a colunas de mármore quanto mais a corações de cera!
São as feições como as vidas, que não há mais certo sinal de haverem de durar pouco, que terem durado muito.
São como as linhas, que partem do centro para a circunferência, que quanto mais continuadas, tanto menos unidas.
Por isso os antigos sabiamente pintaram o amor menino; porque não há amor tão robusto, que chegue a ser velho.
De todos os instrumentos com que o armou a natureza, o desarma o tempo.
Afrouxa-lhe o arco com que já não atira; embota-lhe a seta, com que já não fere; abre-lhe os olhos, com que vê o que não via; faz-lhe crescer as asas, com que voa e foge.
A razão natural de toda essa diferença é, porque o tempo tira a novidade às cousas: descobre-lhe os defeitos, enfastia-lhe o gosto, e basta que sejam usadas para não serem as mesmas.
Gasta-se o ferro com o uso quanto mais o amor! O mesmo amar é causa de não amar, e o ter amado muito, de amar menos.

(Sermões)

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